O epicentro da crise internacional do capitalismo se deslocou para o centro, mais especificamente a Europa. O salvamento dos bancos feito pelo Estado está custando caro e ninguém tem saídas plausíveis senão a radical austeridade fiscal que vai contra a luta histórica dos trabalhadores e seus ganhos defensivos. Os déficits fiscais das economias do centro apontam em média para transbordar o 100% do PIB em dívida. Mas então, o que fazer? Vou fazer um breve apontamento sobre a atual crise européia a fim de solucionar alguns mal entendidos não apenas na ala do FMI, mas também de parte da esquerda.
A crise européia que já se escancarou na periferia (Grécia, Espanha, Portugal, Itália) tem como sua salvaguarda a França e, em especial, a Alemanha. O salvamento diante do “estado de emergência fiscal” visa à relação existente entre os déficits fiscais de grande parte dos países da zona do euro e os bancos franceses e alemães. Por mais que seu início se dê na Grécia, como apontamos, sua crise é um sintoma que emerge diante das profundas dificuldades bancárias que sustentam o euro. A questão é: o establishment europeu – Conselho Europeu, Comissão Européia e Banco Central Europeu – estão fazendo uma grande pressão sobre as economias periféricas impondo políticas de austeridade, redução salarial e da dívida pública a fim de ajudar a zona do euro a sair da recessão. Entretanto, essa estratégia é errônea. Tudo se passa como se problema fosse a falta de disciplina fiscal. Não existe uma exagero fiscal destes países tão grande. Todos eles têm os gastos e empregos públicos abaixo do UE-15 além do nível de salários que é bem menor do que em países como a França.
O grande segredo ocultado pelos veículos da mídia é que o problema da eurozona não está na periferia e sim no centro, mais especificamente na Alemanha. A economia alemã está em baixa durante muitos anos. Seus salários não tem aumentado durante os últimos quinze anos, conseqüência da medidas antisindicais de baixos salários tomada pelos governos de Gerhard Schoeder e Angela Merkel. Esse processo foi facilitado pelo ampla disponibilidade de trabalhadores procedentes da antiga Alemanha do Leste e os imigrante provindos do Leste Europeu. Assim, nos últimos quinze anos a inversões alemãs tem sido escassas (menores que nos países periféricos) e seu crescimento econômico foi lento (muito mais lento que os países periféricos). Além disso, a baixa na rendas do trabalho na Alemanha tem criando um grande problema de falta de demanda, conseqüência da falta de crescimento da massa salarial. Dessa forma, o crescimento econômico alemão foi baseado não no aumento da demanda interna e sim com o crescimento das exportações e a conseqüente acumulação de euros nos bancos alemães. E o que os bancos alemães fizeram com tanto euros? Uma delas é emprestá-lo para os países do mediterrâneo. Esse fluxo ajudou, por exemplo, os bancos espanhóis a estabelecer o complexo bancário-industrial-imobiliário que foi o motor da economia espanhola. Não é a toa que grande parte da dívida dos países da periferia é propriedade dos bancos alemães (e franceses).
Mas então, o que fazer? Como disse recentemente Boaventura de Sousa Santos, numa virada que parece deixar a pós-modernidade democrática como seu paradigma último, a luta de classes está de volta à Europa e em termos tão novos que os atores sociais estão perplexos e paralisados. Concordo plenamente. A esquerda européia ainda tem a dificuldade de não ter outros instrumentos de transformação social que apontem para um horizonte qualitativamente diferente de organização social senão os partidos sectários instalados, por exemplo, na Grécia.
Já apontamos em outros textos que a solução que esta sendo gestada no centro do capitalismo diante da crise é a superexploração do trabalho. Típica dos países dependentes agora a superexploração se torna a resposta do capital para atual crise também nos países de centro. Nunca os que trabalham trabalharam tanto e nunca lhes foi tão difícil identificarem-se como trabalhadores. Sua crescente organizção de trabalho horizontalizada inviabiliza a atuação de sindicatos verticais. Bem, essa saída da crise tem como dificuldade ainda maior para a esquerda sua impotencia, principalmente diante de sua tragédia reformista pós-11 de setembro. Os antigos instrumentos de luta histórica estão esgotados e agora nao fazem parte da solução, e sim do problema. Além disso, a resistência apenas dentro das economias nacionais é fraca demais diante da profundidade da crise. Assim, ou a resistência é européia ou não perderá na sua força. Diante dessas dificuldades organizacionais e estratégicas para a esquerda, uma virada a direita não pode nos assustar.
Fernando Marcelino
Nenhum comentário:
Postar um comentário