segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Sobre o Orkut
O site de relacionamentos Orkut ilustra de maneira paradigmática uma característica fundamental de nossa sociedade nos dias atuais, a saber, que o ser das pessoas constitui-se pelo seu aparecer social. Isto é, a essências das pessoas, aquilo que as constitui e as distingue como tais, é completamente reduzida a simples manifestações exteriores de suas personalidades. Manifestações, diga-se de passagem, cuidadosamente escolhidas, de modo que a constituição de si mesmo torna-se uma espécie de montagem. Uma espécie de montagem que, obviamente, representará muito mais o que a pessoa gostaria de ser do que o que ela é de fato.Neste sentido, a montagem de um perfil não apresenta diferenças significativas em relação à montagem de um produto comercial qualquer, como na escolha das características de um carro, por exemplo, na qual é possível selecionar o modelo, a cor, os acessórios e demais atributos superficiais, sem, contudo, alterar o fato básico de que se trata de uma simples transação comercial. Em ambos os casos, a diversidade de opções disponíveis, que no fim das contas são sempre limitadas, cria uma ilusão de liberdade confortante. O indivíduo pensa realmente ser livre ao escolher entre opções previamente dadas.O fundamental, pelo menos para o site em questão, é que sua função primordial, ainda que isso muitas vezes fique implícito, é simplesmente possibilitar e multiplicar a visualização social de um indivíduo. A realidade de um indivíduo é dada na medida em que seu aparecer social, o seu perfil cuidadosamente montado, é visualisado. Ser é ser visto. Ser é aparecer. Quanto mais observada e relacionada a pessoa, mais realidade ela possui.
Mas devemos evitar condenar o site, ou as pessoas que o usam, pois o que fazem é reproduzir uma condição geral da sociedade atual. Não é isso que vemos a todo tempo? A busca pela celebridade a todo custo, pelos quinze minutos ou mais de fama a que todos tem direito, mesmo que isso implique a falta de sinceridade para consigo próprio, a falsidade para com o seu próprio ser? Não é isso que a mídia, sobretudo a mídia televisiva, nos diz a todo tempo? Ficai famosos! Sede reais!-------O texto acima, destinei-o apenas a um círculo restrito de leitores, todos eles mais amigos da clarificação e da sabedoria do que destas patéticas e inúteis contendas verbais a que se reduzem os 'debates' e 'discussões' do hodierno 'homo academicus', nas quais aferrar-se cegamente à própria estupidez e ao erro crasso constitui sinônimo de pensamento crítico e até mesmo – pasmem! – de filosofia. No entanto, o camarada André Fernandes acabou publicando o texto em seu blog, o que me levou a receber uma série de mensagens e comentários. Com exceção de algumas mensagens, não por acaso provenientes deste círculo de amigos de mente arejada e verdadeiros amantes do conhecimento, a grande maioria do comentários assumia claramente a forma de uma defesa ou de uma justificação da utilização do Orkut, sem qualquer preocupação de debater o texto mesmo, seus pressupostos implícitos e explícitos, motivações e assim por diante. No próprio blog do André há um exemplo deste tipo de comentário, que podemos tomar como um exemplo desta 'forma mentis', que, infelizmente, em nome de objetivos bem mais mesquinhos que o conhecimento e o depuramento de nossas crenças, vem recebendo apoio por parte de não fracos pensadores :http://diarioandrefernandes.blogspot.com/2007/04/sobre-o-orkut.html

3 comentários:

  1. Este texto é de autoria de Rafael Huguenin e está disponível também em

    http://www.orkut.com.br/Community.aspx?cmm=47754268

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  2. É amigo...faltou o crédito! O texto é do Filósofo Rafael Huguenin.

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  3. O problema com esses "sites" de relacionamento é que as pessoas pensam apenas em se mostrarem para as outras tentando interpretarem "papeis" que não condizem com sua própria realidade e condição de existência. São sempre as melhores fotos tiradas nos lugares mais "descolados", os perfis procuram ser o mais "moderninhos" e na hora de descrever a si mesmos, as pessoas procuram cercar-se dos melhores auto-elogios. O que resta no final e um desfile de vitrines sem conteúdo. O que as pessoas esquecem é que a internet pode ser um instrumento poderoso de reflexão e crítica dessa sociedade de consumo predatório que as mídias tentam (e conseguem) impor às pessoas. Temos um poder de contestar e mudar, mas a maioria se conforma em apenas reproduzir o que já vem pronto e mastigado.

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