quarta-feira, 17 de março de 2010

PALPITE INFELIZ!




Quem é você, Caetano, que não sabe o que diz?


Por Walmir Pimentel


Antes de tudo, já peço desculpas sobre a minha fala chula e irritada,
mas, preciso dizer alguma coisa sobre o vídeo tendencioso de Caetano. Me
perdoem desde já a pretensão, aliás, quem sou eu.?
Sem querer ser o outro lado da ferradura no discurso sobre preconceito
racista, social, econômico ou seja lá que preconceito for, Caetano é um
gênio - historicamente - promovido pela polêmica (mas que tem seu valor,
desde a tal Tropicália). A defesa dos "americanizados da bossa nova"
(Carlos Lira, Edu, Tom - o único gênio desse frenesi - Vinícius...), já
diz tudo e, é muito sintomático. José Ramos Tinhorão, um dos maiores
teóricos do samba, junto com o velho Sérgio Cabral, meteram o pau nessa
tendência modista de bossa nova, e não menos João Batista de Mello, (e que
não há como negar uma beleza artificializada e Ianque consumista), porque foi
uma apropriação descabida e maldita do nosso samba duro, de partido, sendo
maquiado para ser digerido pela classe média medíocre carioca dos anos 50 e
60. E foi isso mesmo! Os defensores da "Bossa Nova" - que de nova só tinha o
nome - foram tão covardes com nossos ícones da MPB que, tempos depois, acabaram
indo beber a ´"água de Zé Ketti, de Candeia, de Cartola, de Pandeirinho, de
Ventura, de Zé com Fome e tantos outros que, por carência financeira ou
interesses particulares, venderam primores a esses caras do Alto Leblon e
adjacências abastadas do RJ a preço de banana.
FEITIÇO DA VILA é uma canção em meio a uma "demanda" entre Noel e Wilson
Batista sim, mas, durou 3 anos e nada tem de racismo velado nem declarado -
ao contrário da defesa inconteste que Caetano faz ao Ilê Aiê, como bloco
que só desfila negro no carnaval da Bahia - e vá ao Bairro da Liberdade
confirmar o que digo!
Ninguém diz que Wilson planejou a rixa para se auto promover, visto que
Noel já era consagrado no meio do samba. E mais, ninguém diz também que foi Wilson
quem começou a polêmica, com sua canção "Lenço no Pescoço" que exaltava a
vadiagem meliante, a boemia bandida e caçada pelo estado. E não a vida
humilde e digna do morador do morro, como trabalhador, poeta, pai de
família...

Caetano é de sazonalidade conveniente a ele próprio e, digo isso, embora
seja fã desse dissimulado, em certas canções. No momento em que fez essas
críticas absurdas a música de Noel, devia estar dando "em cima" de
(perdoem-me a grosseria) algum sociólogo xiita, ou algum membro do PSTU ou
querendo sua fatia nos direitos autorais do povo Bossa nova ( ou estava
flertando com algum filho do Wilson). Ridículo e, por isso que João Nogueira
o ESCULACHOU com a cantiga IÔiÔ!!!! Mas, para quem canta no Carnegie Hall
"Áh, um tapinha não dói..". - se dizendo moderno e Kit - o vídeo é pinto!

Não há em lugar nenhum,, receita nem dogma que, afirmem a necessidade de ser
BANDIDO ou DOUTOR para ser sambista. O SAMBA É SEPARADO DAS BOBAGENS HUMANAS.
OS bobos da Bossa nova podiam até ser bons sambistas, se não fossem bons
lacaios modistas ianques....quem sabe?

Vamos as músicas que iniciaram a polêmica em 1933 e, marcaram também uma das
mais ricas parcerias do mundo do samba, que talvez CAETANO (IÔIÔ) NÃO SAIBA:







LENÇO NO PESCOÇO - 1933
(Wilson Batista)

Meu chapéu do lado
Tamanco arrastando
Lenço no pescoço
Navalha no bolso
Eu passo gingando
Provoco e desafio
Eu tenho orgulho
Em ser tão vadio

Meu chapéu do lado...

Sei que eles falam
Deste meu proceder
Eu vejo quem trabalha
Andar no miserê
Eu sou vadio
Porque tive inclinação
Eu me lembro, era criança
Tirava samba-canção
Comigo não
Eu quero ver quem tem razão

Meu chapéu do lado...

E ele toca
E você canta
E eu não dou
Ai, meu chapéu do lado...


FEITIÇO DA VILA - 1934
(Noel Rosa - Oswaldo Gogliano [Vadico])

Quem nasce lá na Vila
Nem sequer vacila
Ao abraçar o samba
Que faz dançar os galhos
Do arvoredo
E faz a lua nascer mais cedo!

Lá em Vila Isabel
Quem é bacharel
Não tem medo de bamba
São Paulo dá café,
Minas dá leite
E a Vila Isabel dá samba!

A Vila tem um feitiço sem farofa
Sem vela e sem vintém
Que nos faz bem...
Tendo nome de Princesa
Transformou o samba
Num feitiço decente
Que prende a gente...

O sol da Vila é triste
Samba não assiste
Porque a gente implora:
Sol, pelo amor de Deus,
Não venha agora
Que as morenas vão logo embora!

Eu sei por onde passo
Sei tudo que faço
Paixão não me aniquila...
Mas tenho que dizer:
Modéstia à parte,
Meus senhores, eu sou da Vila!

Nesta exaltação ao bairro de Vila Isabel, podemos sentir claramente a
boemia, tão presente na vida de Noel Rosa e responsável pelo agravamento de
sua doença (tuberculose). Na canção, Noel implorava para que o sol não
nascesse, pois a roda de samba terminaria e as mulheres iriam para casa.
Vale destacar também a beleza da imagem de galhos balançando ao som do
samba.

Tendo o nome de PRINCESA é só porque toda aquela região foi batizada com nome de
abolicionistas, personagens do período abolicionista e/ou afins. Quem
conhece Vila Isabel e os nomes de suas ruas, sabem o que estou dizendo (O
que não é o caso de IÔIÔ CAÊ)

Outra referência interessante é feita à política do café com leite de São
Paulo e Minas Gerais. Apesar de a política ter se encerrado em 1930, ela
ainda estava bastante presente na memória das pessoas.

No programa Case, da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, Noel criou novos
versos para o já sucesso Feitiço da Vila. Esses versos são fundamentais para
entendermos a provocação seguinte de Wilson Batista:

*Versos adicionais de Feitiço da Vila*

Quem nasce pra sambar
Chora pra mamar
Em ritmo de samba.
Eu já saí de casa olhando a lua
E até hoje estou na rua.
A zona mais tranqüila
É a nossa Vila
O berço dos folgados;
Não há um cadeado no portão
Porque na Vila não há ladrão.

Nos novos versos, Noel fez uma volta à infância, não só na referência ao
choro pra mamar em ritmo de samba, mas, sobretudo, aos tempos em que a Vila
Isabel gozava a má fama de atrair ladrões. Segundo Noel, esse tempo já teria
passado, e o bairro podia se orgulhar de dormir sem cadeado nos portões.
Nesse momento, Wilson Batista viu uma oportunidade de entrar novamente em
ação.

Desde que sua canção Mocinho da Vila fora ignorada por Noel, Wilson Batista
estava fora de cena. Ainda fiel ao sonho de ser famoso e sabedor de que
nenhum compositor popular brasileiro estava tão em evidência quanto Noel,
Wilson não perdeu tempo e escreveu Conversa Fiada:

CONVERSA FIADA - 1935
(Wilson Batista)

É conversa fiada
Dizerem que o samba
Na Vila tem feitiço.
Eu fui ver pra crer
E não vi nada disso.
A Vila é tranqüila,
Porém é preciso cuidado:
Antes de irem dormir,
Dêem duas voltas no cadeado.
Eu fui lá na Vila ver o arvoredo se mexer
E conhecer o berço dos folgados.
A lua nessa noite demorou tanto,
Assassinaram-me um samba.
Veio daí o meu pranto.

Noel não podia ignorar a nova canção. O ajustamento de ritmo e a bela
melodia já continham elementos que permitiam antever o grande sambista que
Wilson Batista seria. A música era indiscutivelmente bem-feita, e o bairro
de Vila Isabel tinha sido debochadamente atacado.

O contra-ataque tinha que ser definitivo, mortal e em grande estilo. Veio na
forma de um samba intitulado Palpite Infeliz - um dos mais populares e bem
elaborados de toda a obra de Noel.

PALPITE INFELIZ - 1935
(Noel Rosa)

Quem é você que não sabe o que diz?
Meu Deus do céu, que palpite infeliz!
Salve Estácio, Salgueiro, Mangueira,
Oswaldo Cruz e Matriz
Que sempre souberam muito bem
Que a Vila não quer abafar ninguém,
Só quer mostrar que faz samba também.

Fazer poema lá na Vila é um brinquedo,
Ao som do samba dança
até o arvoredo.
Eu já chamei você pra ver,
Você não viu porque não quis
Quem é você que não sabe o que diz?
Quem é você que não sabe o que diz?
Meu Deus do céu, que palpite infeliz!
Salve Estácio, Salgueiro, Mangueira,
Oswaldo Cruz e Matriz
Que sempre souberam muito bem
Que a Vila não quer abafar ninguém,
Só quer mostrar que faz samba também.

A Vila é uma cidade independente
Que tira samba mas não quer tirar patente.
Pra que ligar a quem não sabe
Aonde tem o seu nariz?
Quem é você que não sabe o que diz?

Obra-prima da música brasileira, o samba ficaria para sempre na memória do
povo e de Wilson Batista. Logo no primeiro verso, Noel chama atenção para o
fato de o rival ainda não ser tão conhecido: "Quem é você que não sabe o que
diz?".

Mais do que provocativa, Palpite Infeliz também é uma obra integradora, que
promove a confraternização do mundo do samba. A canção defende a Vila Isabel
com elegância, sem colocá-la acima de Estácio de Sá, Salgueiro ou Mangueira.
Para Noel, a disputa estava encerrada. Já Wilson pensava diferente, e a nova
resposta veio com um golpe baixo intitulado Frankenstein da Vila. O samba
era uma pilhéria com Noel, satirizando a sua feiúra provocada pelo defeito
que tinha no queixo, causado por um acidente na hora do parto.

FRANKENSTEIN DA VILA - 1936
(Wilson Batista)

Boa impressão nunca se tem
Quando se encontra um certo alguém,
Que até parece o "Frankenstein".
Mas, como diz o rifão,
Por uma cara feia,
Perde-se um bom coração.

Entre os feios estás na primeira fila,
Eu te batizo "Fantasma da Vila".
Essa indireta é contigo,
E depois não vás dizer
Que eu não sei o que digo.
(Sou teu amigo)

Algumas testemunhas afirmam que Noel não deu importância ao samba, achando
até graça do deboche. Outros garantem que a história não foi bem assim.
Cícero Nunes, companheiro de muitas cervejadas, jura ter visto Noel chorar
ao tocar no assunto. Ainda no mesmo ano, Wilson escreveu Terra de Cego, e
cantou o samba para Noel no Café Leitão:

TERRA DE CEGO - 1936
(Wilson Batista)

Perde a mania de bamba
Todos sabem qual é
O teu diploma no samba.
És o abafa da Vila, eu bem sei,
Mas na terra de cego
Quem tem um olho é rei.
Pra não terminar a discussão
Não deves apelar
Para um barulho na mão.
Em versos podes bem desabafar
Pois não fica bonito
Um bacharel brigar.

Noel gostou da melodia, mas pediu para trocar a letra no próprio botequim.
Como Wilson também havia andado de namoro com Ceci - uma antiga paixão de
Noel Rosa -, a nova letra foi dedicada a ela. Com a música pronta, Noel
viveu um "amor de parceria": a mulher era Ceci; o parceiro, Wilson Batista.

DEIXA DE SER CONVENCIDA - 1936
(Noel Rosa - Wilson Batista)

Deixa de ser convencida
Todos sabem qual é
Teu velho modo de vida.
És uma perfeita artista, eu bem sei,
Também fui do trapézio,
Até salto mortal
No arame eu já dei.
(Muita medalha eu ganhei!)
E no picadeiro desta vida
Serei o domador,
Serás a fera abatida.
Conheço muito bem acrobacia
Por isso não faço fé
Em amor, em amor de parceria.

Era o fim de uma briga musical da qual pouca gente tomou conhecimento na
época (com exceção do meio artístico). É difícil saber até que ponto Noel
guardou alguma mágoa ou ressentimento, principalmente com relação ao samba
Frankenstein da Vila. Quanto a Wilson, façamos justiça: não foi por causa da
rixa que ele se tornou alguém na vida. Seu tempo chegou pelo próprio
talento. Noel faleceu em maio de 1937. A Wilson ficou saudade, respeito e
grande admiração.

Antes de morrer, em 1968, Wilson Batista viu a briga com Noel virar disco
nas vozes de Roberto Paiva e Francisco Egídio (Polêmica, 1956). O compositor
também fez alguns sambas com menções a Noel Rosa. Entre eles, podemos citar
Quero um Samba e Terra Boa.

QUERO UM SAMBA
(Wilson Batista - Waldemar Gomes)

Diga para o dono do baile
Que nós queremos sambar
A noite inteira sem tocar um samba
Nem parece que estamos no Rio,
A terra de Sinhô e o berço de Noel...

TERRA BOA
(Wilson Batista - Ataulpho Alves)

Terra de Santos Dumont
Carlos Gomes, Ruy Barbosa,
Grande Duque de Caxias,
Castro Alves, Noel Rosa...

LOGO GENTE, HÁ COISAS QUE IÔIÔ FALA QUE NÃO DEVEMOS DAR OUVIDOS, NEM
CRÉDITOS. POIS, VEZ EM QUANDO ELE PENSA COM O CÉREBRO DO TESÃO ANAL - QUE
INFELIZMENTE, ELE PRÓPRIO DISCRIMINA PELO VIÉS INSANO DE SUA
INTELECTUALIDADE AGUDA, RELATIVA E POLÊMICA.

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