quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Caminhos para se pensar uma História do Trabalho no Brasil





A História do Trabalho no Brasil suscita diversas questões para entendermos as agências dos indivíduos e os caminhos traçados pela historiografia para interpretar e procurar entender o comportamento do indivíduo no mundo do trabalho.
No entanto, a historiografia mais tradicional parece ter deixado escapar temas por não serem considerados relevantes para os autores. Assim, a História do Trabalho no Brasil tem dificuldades em estabelecer relações trabalhistas em economias não-exportadoras, não-fabris ou não-urbanas, por exemplo. Desse modo, com respeito à historiografia do período colonial, novos estudos têm apontado para as relações de trabalho nas propriedades rurais não ligadas diretamente à economia agro-exportadora, mas à economia de subsistência e àquela voltada para o mercado interno; atentando, por exemplo, para o número de escravos empregados nestas economias em comparação com o número empregado na agricultura de plantantion.
Diversos trabalhos historiográficos apontam para a importância do tráfico de escravos na economia, já que a reprodução em cativeiro não era satisfatória para atender às demandas, sendo o emprego da mão-de-obra escrava primordial em todos os setores produtivos e em todos os serviços. Desse modo, o sistema escravista “criou” diversas profissões, tanto nas cidades como no campo.
Embora alguns trabalhos mais tradicionalistas afirmem que os escravos das plantations eram diferentes dos escravos urbanos – aqueles qualificados para assumir funções especializadas dentro do plantel, enquanto estes seriam executores de múltiplas funções, sem uma especialidade específica e, portanto, mais “ecléticos” – concordamos com Kátia Mattoso que “a especialização é determinada segundo as necessidades do mercado ou da boa vontade do senhor”; leia-se “boa vontade” como um tratamento mais justo ou uma remuneração (nos casos de “ganho”) mais compensadora. Assim, a demanda (e a especialização) viria de acordo com a conjuntura e a concorrência.
Os trabalhos cotejados destacam as diversas hierarquias e gradações, tanto econômicas e políticas quanto étnicas e culturais, no mundo do trabalho e nas relações cotidianas entre africanos e crioulos, cativos e libertos. Conrad destaca as diversas categorias e funções criadas e recriadas no sistema escravista e constata que essa diversidade de funções poderia ser executada por qualquer modalidade de trabalhador; cativo ou liberto, africano ou crioulo.
Assim, a presença de escravos no ambiente fabril questiona a tese segundo a qual haveria incompatibilidade entre trabalho escravo e atividade industrial. Kátia Mattoso chama a atenção para o mito de caráter eminentemente “eclético” do escravo da cidade, o qual estaria apto para qualquer “ganho” que não exigisse nenhuma especialidade, enquanto o escravo do campo seria mais especializado por executar funções específicas. Os “cantos” – local de ajuntamento de diversos segmentos profissionais - estudados por João Reis na Bahia, o monopólio de algum tipo de “ganho” por uma determinada etnia – como os carregadores de café no Rio de Janeiro, função quase que exclusivamente exercida por escravos minas - e, ainda, o monopólio do comércio de gêneros alimentícios exercidos pelas africanas quitandeiras põem por terra essa teoria e demonstra o auto grau de especialização, para os padrões da época, dos escravos e libertos ganhadores das cidades.
Desse modo, a historiografia sobre a escravidão pode rever diversas postulações e pensar novas perspectivas para entender o mundo do trabalho no contexto da escravatura.
Os estudos da pós-abolição, no que diz respeito ao mundo do trabalho, dimensionam em excesso o caráter da mudança e da entrada de um novo tipo de trabalhador: o imigrante. A partir de então, segundo esses estudos, a História do Trabalho no Brasil pode ser contada, pois, já temos a figura do operário e da classe trabalhadora. Essa História pode ser avaliada a partir do imaginário sobre o que seria a classe trabalhadora, construído pelos meios acadêmicos.
Outras dimensões estão sendo re-elaboradas pela historiografia. A relação do trabalhador com o Estado, suas percepções políticas, suas interações e conflitos com outros agentes; enfim, as esperanças, expectativas, respostas, reações, estímulos, percepções, vivências – tudo relacionado à experiência política (e cultural) do trabalhador em ralação à sociedade do seu tempo. Assim, diversos estudos têm refletido em torno de conceitos, categorias e instituições como a fábrica, o sindicato, o populismo, o trabalhismo, cultura política, sindicalismo, greve, cidadania, etc.
Novas abordagens, portanto, têm suscitado questionamentos que vão além de preocupações com rupturas nitidamente demarcadas ou determinações que subordinam as ações individuais e coletivas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário